Já não sei escrever, se alguma vez soube. Sabia-me bem, pelo menos, e só isso me interessava. Era uma necessidade que satisfazia facilmente, e me libertava de muita coisa, e me explicava tantas outras. Derretiam-se-me os nós. Desfazia-me em palavras, e o gelo que me forrava pingava letras frescas - ou a ferver tantas vezes. Transformava-se a dureza do gelo na limpidez maleável e refrescante - ou na rispidez asfixiante da raiva momentânea -, nas palavras que me pingavam na tela branca. Tantas vezes a minha única companhia: uma tela branca à minha frente, à espera de me falar para que lhe segrede a minha alma.
Esvaziei-me de palavras quando me queria esvaziar do que me faz escrevê-las. Foi dar ao mesmo afinal. Silêncio. Mas até o silêncio tem muitas famílas e muitas espécies, este meu silêncio não é vazio, em nada, mas é tão embrulhado em mim que me prende as palavras, torna-me prisão de mim mesma deixar este silêncio em liberdade muda, às voltas dentro de mim, a torcer-me devagar a alma até asfixiar o coração. Cada vez mais, deixar-me sair de mim não faz sentido, por mais sentido que seja. saio de mim e não encontro onde me poisar, não tenho porto para o meu querer, nem abrigo para o meu sentir. Não tenho uma pessoa para mim e para ouvir o silêncio que me grita por dentro sem arranjar razão para sair. Não vale a pena. às vezes parece que já nada vale a pena, então poisamos a pena e escrevemos com o silêncio.
2 comentários:
Olá ev@
Olá anónim@.
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