"Matilde esforçava-se por tratá-lo por tu; evidentemente dava mais atenção a esta maneira de falar estranha do que às coisas que dizia. Esse tratar por tu desprovido do tom de ternura não dava prazer algum a Juliao; admirava-se de não sentir felicidade; e, para a sentir, teve de recorrer ao raciocínio. Via-se estimado por aquela rapariga tão altiva e que nunca concedia louvores sem restrições; com este raciocínio conseguiu a satisfação do seu amor-próprio."
Stendhal, in Vermelho e negro
[... Para sentir felicidade teve de recorrer ao raciocínio? Engraçado como pelos vistos a felicidade pode ser pensada, convencida se agradar ao nosso amor-próprio!! Nunca tal me passaria pela cabeça. A felicidade para mim sempre foi sentida sem pensar, senão é talvez contentamento, satisfação. Felicidade não deixa espaço para pensar, não enquanto se sente, depois sim, pode-se pensar e até tentar entender ou justificar, sem grande resultado, provavelmente. Ser feliz talvez seja uma coisa que se possa analisar e pensar porque é um contínuo, estar feliz, sentir-se feliz é uma plenitude que anula o pensamento, talvez por isso seja o estado de felicidade pura.
E eu agora penso que talvez seja boa ideia dormir, porque a ideia de ir trabalhar amanhã não é lá muito boa... Eheh]
6 comentários:
"Para sentir felicidade teve de recorrer ao raciocínio", "...a felicidade pode ser pensada, convencida se agradar ao nosso amor-próprio." Aqui para nós, não é isto que a maioria faz? ligando a uma reflexão sua mais abaixo, que li para aí 3x :), é o tal comodismo de regar flores de plástico e passar a vida a sonhar com as selvagens, a maioria das pessoas que conheço (talvez mesmo todas as que conheço) é assim, vive uma felicidade raciocinada, já eu, não deixo que me formatem e quando é, é mesmo, de caixão à cova, para o bem e para o mal, sem nem conseguir lá raciocinar muito bem, sim, podemos vir a sofrer muito, muito mais, mas também saberemos muito mais sobre o que é isto de estarmos vivos e termos capacidade de sentir.
Sim, aqui para nós talvez seja o que a maioria faz... é o manter as flores de plástico na jarra e ir regando para nos convencermos que crescem, que reagem, que têm vida dentro. Não têm, mas há para quem esse teatro baste, e talvez essas pessoas sejam felizes nessa felicidade pensada, talvez seja possível, se não conhecerem a outra, talvez seja possível.
Quanto ao resto, Filipa, é tudo verdade mas o pior de estar vivo, de se estar vivo uma vez na vida e tanto e muito, é poder-se morrer. E pior do que saber isso e ter medo que aconteça enquanto nos sentimos felizes e vivos, é afinal morrermos mesmo.
O pior de estar vivo desta maneira é morrer e continuar a respirar.
Se calhar a felicidade raciocinada, tal como as flores de plástico, é mais cómoda, mais prática, as outras como dizes "de caixão à cova" acabam muitas vezes na cova sem caixão... é um bocado chato...
Estar-se vivo uma vez na vida e tanto e muito e poder morrer-se e continuar a respirar é um risco que se corre, como acabar na cova sem caixão, sim é chato, mas eu daí ponho o ênfase no tanto e muito que soubemos que é possível estar-se vivo e vejo isso como um privilégio, a que só alguns têm acesso, quem desconhece contenta-se com o que conhece, sim, mais prático, mais cómodo, mas Eva, eu não queria essa felicidade pré fabricada para mim, podem nunca sofrer muito, mas também...nunca...muito...nada :) não é?(e por aquilo que me vão dizendo, sabem que estão a forçar um bocadinho a coisa, resignação, portanto). Sei que quando estamos em pleno sofrimento não conseguimos sentir que exista aí nada de bom, mas visto de fora é o preço a pagar por não nos contentarmos com teatros plastificados e caramba Eva se há coisa que eu admiro é isso, quem paga o preço de não sucumbir ao plástico, assim como a Eva.
O ênfase é sempre esse quando se tem alma e enquanto se tem esperança. Eu já não sinto nenhuma das duas, e acho que há coisas que com sorte acontecem uma vez na vida e não mais, por isso a tentação do plástico é grande, mesmo que não seja sapato para o meu pé, sempre dá para se andar. Eu ainda não sucumbi ao plástico mas sucumbi da vida, ou assim me sinto nestes dias que não parecem acabar...
Vejo alma e esperança no que procura para colocar no blog e no que escreve.
E se for só uma vez na vida, ao menos aconteceu e foi uma sorte sim.
Se a Eva chegar a sucumbir ao plástico, palpita-me que vai ser sol de pouca dura e lá vai rapidamente procurar o ecoponto Amarelo mais próximo para se livrar daquilo ;).
E não vou desistir de tentar fazer com que veja as coisas de uma maneira mais positiva, temos de ser uns para os outros e eu que entro assim no seu cantinho virtual sem ser convidada e que gosto tanto de ler o que aqui se escreve, também não é nada de mais dar qualquer coisa em troca e portanto de vez em quando vou dizer-lhe de alguma maneira, que pelo menos esta leitora não quer cá sucumbimentos :)
:)
é verdade que não sou de falsificações, prefiro o barato genuino do que uma falsificação do que não posso ter. Não gosto de fachadas e não as aguento muito tempo, é verdade, mas o cansaço é demais. Não tenho esperança de voltar a viver nada com a mesma intensidade, mas tenho esperança de viver algo mais verdadeiro, mais reciproco, ainda que nunca mais a surpresa e a entrega seja possivel desta forma, espero que me traga alguma felicidade. Da não raciocinada. Alguma.
(e obrigada pela fé em mim e no meu não sucumbimento ;), por alguém anónimo que nem conhece, por alguém assim com este cantinho virtual que sou tão eu. obrigada)
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