Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

01 dezembro 2014


Queres cortar o fio, todos os fios, seja. Não quero que te falte nada. Mas quero que saibas que nunca estive presa por fios, não a ti. Que quando se ama não há fios, porque os fios podem-se cortar, podem ser cortados. Não aprendeste isso porque não amaste. Ou se calhar sim, não sei. Mas não a mim. Pois seja, não é coisa que se obrigue, force ou se conquiste (lembro-me de dizeres que não sabias conquistar ninguém, que não sabias, nem fazias ideia, de como isso se poderia fazer. Acho que finalmente te entendi. Há coisas que não se conquistam, ou são ou não são. Ou nascem já sendo, ou não se fabricam - fabricando nunca chegam a ser). Ou acontece ou não acontece. Quando acontece não há fios. Há um ar que nos envolve que se respira, que se alimenta e nos alimenta; um mar em que se mergulha, para onde nos virarmos ele envolve-nos, cerca-nos, e dá, ao mesmo tempo, a liberdade de não ter chão, de tudo ser possível, e isso parecer impossível. E se calhar é, mas respira-se, nada-se sem ar, mergulhadores de profundidade ou não. Quando se ama não há fios, nem tempo, por isso nunca se espera aguardando - aguardar é saber que o tempo passa, senti-lo passar -, mas espera-se sempre sem saber que se espera ou sem querer sequer esperar, vivendo, um dia a seguir ao outro. Ou talvez a espera seja da vida por nós, para que estejamos em condições de a viver, de a receber. Porque os fios não se cortam, não há fios. Mas talvez um dia, sem saber, ou perceber como, nos vejamos mergulhados noutro mar, respiremos outro ar, o chão nos fuja dos pés e das mãos, e o tempo volte a não existir. Os fios foram cortados. Só há fios quando (já) não se ama.

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