....e depois como se não bastasse há a crueldade própria da nossa mente que não mente, que não nos sabe mentir nunca nos dando afinal a verdade das coisas, e sem aviso, porque nos sentamos no chão da nossa sala no sítio, em que nos lembramos de repente, estávamos em certo dia, melhor, certa noite a partilhar um milfolhas com um copo de vinho tinto à luz de velas e a ouvir Portishead, e quase sentimos aquele braço a envolver-nos, a agarrar-nos pouco acima da cintura e a puxar-nos - peito com peito, face com face - ao som da música, a dançar sentados, calados, juntos, tão juntos. Parecia, parece-me ainda na mentira da memória cruel, juntos mesmo, tudo junto, tudo uno. Tudo nós. E novamente a crueldade da nossa mente a lembrar-nos, a gritar-nos, a apunhalar-nos, que deve haver casos assim, que é só coisa de corpos, que não haja confusões, e que como não estão aqui - neste sítio em que o acaso me plantou no chão da minha sala -, que não estando aqui, nunca estas ou outras memórias traem cruelmente essas mentes. Vendo a alma por uma mente assim. Aliás, já vendi, ou melhor: dei.
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