Afogar-se
às vezes é morrer
em líquidas palavras
que nunca dizemos.
Silvia Chueire
[é raro afogar-me no que não digo, às vezes acontece é que as lágrimas se me prendem na garganta e calam-me as palavras. se me permito abrir a boca sai-me o choro e não o que haveria a dizer, por isso afogo-me no choro que não chega a nascer e que mata o som de qualquer palavra que quisesse dizer, se conseguisse. é preciso muita mágoa, e muito tempo, para isto me acontecer; mas acontece, raramente, mas acontece. calo-me e afogo-me em silêncios vários, de compassos de espera, em que espero por mim. não gosto de partilhar lágrimas com quem mas provoca, posso partilhá-las com quem gosto e gosta de mim, mesmo que me magoe, mesmo que me entristeça e a tristeza me faça lamber lágrimas; mas com quem conscientemente me quer magoar, não. não dou esse troféu, por norma, a ninguém, só quando já não sou eu, mas uns restos do que normalmente seria.]