Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

05 abril 2015


... A dama da noite, sob um fino véu diáfano, espera (talvez) o seu cavaleiro negro, camuflado de noite na escuridão, que a luz que irradia nos caminhos lhe  trará...
(Para quem ainda acredita em histórias de encantar... Eu cá ando só de passeio e (de)parei-me com este espectáculo... As palavras só apareceram assim, sob encantamento desencantado...)

Este mocinho faz hoje 50 anos, ao que parece, e eu gosto, gosto do mocinho. Muito.
Era-me relativamente indiferente até há uns anos, agora olho para ele e só vejo aquela boca, e eu gosto, gosto daquela boca. Lembra-me boca de beijos e risos malandros, e eu gosto, gosto dessa malandrice. 
Realmente, e agora aqui sentada a pensar uma série de coisas, que gosto, umas que sempre soube que gostava outras que fui descobrindo, Lembro-me de um dia aqui estar nesta mesma posição a escrever outras coisas, coisas que tinham a ver com a admiração e o orgulho que sentimos em alguém, que isso é imprescindível a quem ama, que é uma expressão do amar - é talvez o seu respirar. Dou por mim a pensar nisto por uma frase que li algures que dizia  "só se ama o que se admira". E dessa admiração vem também o orgulho de fazer parte, de alguma forma ser parte desse alguém, tanto, que tomamos para nós a satisfação de ver quem amamos satisfeito, realizado. E estou aqui sentada a pensar que nunca senti que por mim sentissem esse orgulho quase que em espelho, isso que torna o reflexo e o que é reflectido, não a mesma carne, mas a mesma alma que habita o amor de duas pessoas.
(juro que isto era para não ser nada disto, era para acabar ali no mocinho, mas a cabeça voa-me...)


Hoje sonhei. Ando com as noites agitadas por sonhos, a dormir mal, ainda que as vezes a sonhar bem, a acordar com um sorriso nos lábios, mas com a cabeça a pôr-se logo a trabalhar: que não, que não pode ser, que não é assim que funciona, e que nem vale a pena sonhar com isso - funciona quase como publicidade enganosa. Acordei a pensar isto, ainda que com um sorriso de quase esperança nos lábios. Deixei-me ficar na ronha, enrolada em mim no meio dos lençóis, à espera que o sonho acordasse de mim, porque eu há muito que acordei dos sonhos.

Bom dia.
É isto.

Boa noite
Em conversa disseram-me:
-...ao fim de vinte anos juntos um gajo já nem paciência tem para comer a mulher.
E eu respondi:
- não exageres, para isso vocês arranjam sempre paciência...
- olha que nao, pelo que vejo e ouço, é mesmo assim, o que acontece é que tem de se esvaziar os tomates... Mas é uma coisa mecânica, sem aquela vontade, e isso não é "comer"... É só mesmo vontade de esvaziar os tomates...
E aquilo caiu-me cá dentro como um eco do que já tinha ouvido, aquela mesma expressão tão dura, tão crua, tão feia.. Ouvi-a pela segunda vez na vida e a dizer exactamente o mesmo, precisamente a mesma mensagem. Fiquei a pensar que realmente há quem veja certas coisas como uma compensação, um aproveitar quem está ali à mão, um alívio, um aliviar de vontade meramente física,  por, no fundo, condescender estar com alguém que já não lhe interessa. Mas enfim, não têm razão para dizer que não, e precisam de esvaziar os tomates. E é triste, muito triste. Tudo. No dia em que a pessoa com quem eu esteja não tiver vontade de me comer, eu agradeço que não condescenda continuar comigo. Quando já não gostar de mim, que mo diga, não condescenda ficar comigo por quaisquer outras razões, e entretanto ir esvaziando os tomates. Não, eu mereço mais que isso, valho muito além de condescender ser uma condescendência para alguém.
Sou mulher de ter muito mais medo de ficar com quem não me quer do que de ficar sozinha.
Sou esquisita, paciência, e isso podem condescender à vontade.