Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

29 janeiro 2015





Quando uma pessoa não consegue dormir, não arranja posição, dá voltas e revoltas, e o conforto lhe foge de todas as maneiras, dá por si sem querer a lembrar-se das vezes sem fim que teve nas costas o calor dum peito que era o toque do conforto, da intimidade, do enrolar os corpos e as almas se misturar em. E, de repente, percebe que o conforto que a alma foi à procura sem querer nas sensações vivas dessas memórias adormecidas, dão uma saudade desconfortável do que talvez não tenha existido assim para toda a gente. Apenas para mim, apenas nas minhas costas, apenas na imaginação da minha alma. Mas o desconfortável, percebo, não é saber isso, mas sim descobrir saudades onde já não as quero. Sentir, ainda, o desconforto do nunca mais para sempre.
Hoje, de tão exausta, não me lembrarei de nada; e espero sonhar com o futuro, para o futuro. Onde partilharei memórias hoje ainda por fazer, memórias partilhadas ao adormecer no conforto dum abraço, a duas peles, que nos veste a alma. Aos dois.

Boa Noite

Uma fachada antiga cheia de janelas a espreitar entre os toldos.
Gosto.
É preciso abrir janelas, arejar, deixar o sol entrar.

Bom Dia




Cabeça quase encostada ao vidro, pelos olhos passa o mundo a correr, mas deixo de o ver, o meu olhar faz ricochete no vidro a fazer-se de espelho, devolve-me o olhar - vejo-me. Algo em mim mudou, não sei precisar, não consigo explicar, mas o mundo lá fora passa a correr e eu, no espelho disfarçado de vidro,vejo uma mulher. Quase não me reconheço, nao sei do paradeiro da miúda que me emprestava o cartão de visita, e pergunto-me por ela. Vejo-me mulher no vidro que vira espelho. Nunca cheguei a ser bonita, mas chegaste a fazer-mo sentir. Pouca gente o conseguiu, muito pouca. E só nessas alturas desejei mesmo sê-lo, para que não te enganasses ao enganar-me. Para que estivesses certo, se era isso que gostarias de ver, que gostavas de ver. E eu gostava que gostasses de ver, e de to ver no olhar e ler na ponta dos dedos, na temperatura da pele, e na falta de espaço entre eu e tu. Esse espaço que agora sobra e não é nada, sendo o mundo todo que corre desenfreado na noite lá fora, e o vidro a fazer-se espelho que não engana.
Às vezes o espaço da distância parece coisa que a vista alcança mas ao olhar não chega. Há olhares que fazem ricochete. E cá dentro não há espaço. Mesmo que tudo esteja vazio.

Boa noite