Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

13 novembro 2015

[foto de Don Whitebread]

"Não a enganei com o estafado tudo passa, porque da desilusão e do sofrimento restam sempre cicatrizes. Cicatrizes feias e fundas, as que doem em permanência."

Do grande Rentes de Carvalho no seu Tempo Contado
(Ainda há dias pensava que já tenho saudades de o ler em romance é tenho dois na estante na calha para serem lidos assim acabe os Karamazov... Falta-me aquela sensibilidade lúcida.)

Há quem goste de pensar e convencer-se que com o tempo tudo passa, que quando esse tempo - quanto quer que ele tenha de ser - passar tudo se esquece, tudo se resolve, que tudo fica bem. Que daqui a dez anos seremos todos muitos felizes. Não percebem que quando nos tocam a alma e ela sai ferida, magoada, amachucada, quem a tem guarda-a, mas com cicatrizes. O tempo só torna feridas abertas em cicatrizes que doem como as dores fantasma, de quando em quando de forma permanente. Não passam. Não é pessimismo ou fatalismo, é apenas lucidez, é ver a realidade mesmo que não seja o que gostaríamos de ver, é escolher não fechar os olhos. 
A quem sente a sério e profundamente e se magoa as cicatrizes doem sempre, não desaparecem, mesmo que lhes façamos boas operações estéticas para que ninguém desconfie que ali há cicatrizes fundas, violência profunda, dor latente fria pelo tempo, que não se quer assumir, elas doem. Mas isto é para quem sente. Para quem não sente tudo passa, se arruma, se resolve e se esquece. De olhos fechados.


Nem tudo passa, há coisas que permanecem: umas boas que o tempo, por muito que passe, não consegue estragar; outras que se estragam para sempre, passe o tempo que passar. Há coisas para que o tempo não é dimensao.