Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

01 outubro 2013


Há quem se habitue à escuridão. Há quem viva só na noite, onde as sombras se esfumam de luz delicada, onde os fantasmas habitam o seu hábito em silêncio e discrição. De tanta noite os olhos se habituam e se lançam ao céu, onde descobrimos o brilho inebriante das estrelas, e nos apaixonamos pelo luar fresco que nos banha a pele. apaixonados, enredados, estrelados, esquecemo-nos da escuridão fria, esquecemo-nos que há outras luzes mais fortes que fazem maiores as sombras que perseguimos. Esquecemo-nos que precisamos do calor na alma dessa luz na pele. Esquecemo-nos, ou fugimos de saber, que a noite cresce e amadurece para amanhecer, que as estrelas que salpicam o céu, e apaixonam o olhar, têm de dar lugar à estrela maior, e a um azul mais manso. Há pessoas que não querem amanhecer.
E está tão escuro aqui.
Sinto frio.

o teu rosto à minha espera, o teu rosto
a sorrir para os meus olhos, existe um
trovão de céu sobre a montanha.

as tuas mãos são finas e claras, vês-me
sorrir, brisas incendeiam o mundo,
respiro a luz sobre as folhas da olaia.

entro nos corredores de outubro para
encontrar um abraço nos teus olhos,
este dia será sempre hoje na memória.

hoje compreendo os rios. a idade das
rochas diz-me palavras profundas,
hoje tenho o teu rosto dentro de mim.

José Luís Peixoto



[tantos dias que são hoje na memória, tantos dias que amanhã serão hoje na memória, memórias que se alimentam de memórias, de sorrisos que puxam sorrisos, hoje, amanhã e depois; filhos de sorrisos que se sorriram em dias que já não são dias, são eternidades dentro da prisão dos dias sem ti, em que livremente te penso, te sinto e te gosto. Tenho todos os dias o teu rosto dentro de mim, as tuas mãos pelo avesso da minha pele, o teu olhar dento do meu sorriso de memórias, de hoje, de amanhã, ou de depois. ainda espero o amanhã que será hoje, ou o hoje que seja esse amanhã. E espero contigo dentro, por dentro de ti sem saberes. Infiltrei-me no meu sangue que pulsa e vive, e onde me corres desvairado. o meu caminho de ti são as memórias que vivo todos os dias na liberdade de gostar de quem não consigo, nem creio querer, deixar de gostar. E gostar é tanto - mas tanto - querer gostar e continuar a querer gostar. 
E como deixar de gostar do amanhã que queremos amanhecer?
E eu amanheço com os lábios já num beijo que te espera. 
amanheces? amanhecemos?]