Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

29 janeiro 2012

"Gosto muito dele, mas não há homem nenhum de quem possa gostar mais do que gosto de mim."
Gostava de ter esta distância racional dos sentimentos, como se lhes estivesse por fora, como se lhes sobrevivesse. Não consigo, nunca consegui, por muito que racionalize tudo , ou tente, a mão, o acto, vai depois de acordo com a alma. O corpo trai a razão tantas vezes, mas não a alma. Desisti já de os tornar independentes, andam de mãos dadas, e aprendi que assim a paz interior é maior, ainda que muitas vezes em tumulto, ainda que tantas vezes com dias dificeis, ainda que tantas vezes essa pouca paz tenha o barulho de fundo ensurdecedor da razão, a gritar-nos aos ouvidos.
Não consigo pensar assim, talvez seja falta de amor próprio, talvez, não digo que não. Mas eu entendo-o propriamente,  apenas como um amor diferente, é que há pessoas de quem gosto porque gosto de mim, e gosto de mim porque gosto deles, está tudo misturado, os terrenos invadem-se mutuamente, nunca consegui muito bem estabelecer fronteiras internas à razão de regra e esquadro. Para mim, gostar de algumas pessoas é como gostar de mim, porque elas já se fizeram um pouco parte de mim, não gostar delas é trair-me um pouco, enxotá-las é esvaziar-me aos poucos. Nem sempre esse gostar de alguém, ou de mim, é pacífico, nem sempre me traz apenas alegrias e felicidade. Eu tenho também tantas características em mim que só me trazem problemas e dissabores, e mesmo que muitas vezes diga, e queira pensar o contrário, gosto de mim assim, não mudava os meus defeitos, porque isso mudaria as minhas qualidades, alteraria o meu (des)equilibrio natural, e deixaria de ser eu, e eu no fundo, não desgosto assim tanto de mim que me que me queira mudar por dentro, como quem refaz a sua decoração de interiores. Sofro, mas sou eu a sofrer, e sofro perto e na pele não à distância remota a que controlo o que sentir ou não, e por quem. Não tenho o comando da minha vida de fora de mim. Não sinto à distância. Sinto, porque sentir, para mim, é ser por dentro. É sermos o que somos quando gostamos de quem gostamos, ou de quem não conseguimos gostar.

27 janeiro 2012



[Desliga a luz. Deixa a vela a dançar nas sombras dos rostos. Fecha os olhos. Segue o calor, segue o cheiro que é teu sem te pertencer. Encosta-te. Ouve a respiração e o outro coração debaixo da tua pele. Agarra-lhe nos braços e embrulha-te neles. Fecha-te neles. Mistura os dedos dele nos teus ao fundo das tuas costas, não o deixes fugir. Cola o corpo ao dele e devagarinho dança a música que já não ouves.
Beija o beijo que sonharam.]


It's like my whole life never happened
When I see you, it's if I never had a thought
I know this dream, it might be crazy
But it's the only one I've got. Okay.




26 janeiro 2012

Hoje vou sair do trabalho mais uma vez sem pressa, sem pressa de chegar a lado algum. Sem ter a vida embrulhada para encaixar cinco, dez, quinze minutos para saborear um bocadinho bom, um momento que dura muito mais do que os minutos que me come da vida. Alterar às vezes a vida toda por uns minutos e nunca me arrepender. Nunca me arrependi, mesmo quando depois de tanta cambalhota nas horas, de arranjos e rearranjos, que o outro lado nem sabia que aconteciam, não dava nada, outras só ao telefone, outras a conversar perto, quase em sussurros, outras só embrulhada em silêncios quentes que depois nos aconchegam na hora de adormecer, menos sozinha do que diz o espaço vazio que o corpo não ocupa na cama. Agora nada. Os silêncios de agora são frios, duros como pedras, até os sonhos me gelam quando finalmente cedo ao sono. O telefone não apita a queixar-se de mensagens, não toca com a urgência de ouvir, ou de falar, com ninguém. A vida torna-se mais calma, mas menos em paz, é uma tranquilidade cansada do nada e de tudo. 
Lembrei-me disto porque hoje, pela primeira vez, vou ao martirio e não tenho companhia na espera, nem ninguém à minha espera no fim. E este sim, é um martírio que não acaba, e que começo a ter medo de um dia acabar para recomeçar, para voltar a passar pelos dias em que parece que passamos meio zombies por uma zona devastada de nós, um deserto sem sol ou calor, uma anestesia ao que nos fazia sorrir. (sorríamos? será? mesmo?). Não quero passar por isso tudo outra vez. Por isso o medo. Também a mim, o medo. Essa kriptonyte do que poderia vir a ser bom.
Começo a achar que também já me tem, já me agarrou.
Pior, não sei se lhe quero fugir.
E isto não sou eu.
Ahhhhh...coisas boas coisa boa
[se bem me lembro...]

24 janeiro 2012

Obrigadinha, sim?
Vim o caminho sem música, desliguei. Vim a apreciar os pensamentos e o sol. Tinha acabado de ouvir pedaços de vida que me tocaram, por leves que fossem, puseram-me a pensar que de facto males de amor por muito que doam, que doem, por muito que nos suguem toda a vida que nos corre nas veias, é um luxo. Enquanto não tivermos de pensar em como vamos dar de comer e vestir aos filhos, enquanto não tiverem fome nem frio, os problemas por muito sentidos que sejam, são já um luxo. Há tantos luxos que classificamos como necessidades básicas, que todas as classificações são injustas e relativas. Pus-me a pensar o que de facto é básico, é suporte para mim e lembrei-me duma conversa que tive com o meu pai, já eu estava separada, no Verão no meio das nossas caminhadas e cafés nas esplanadas, quando eu ainda olhava para ele e não me lembrava sempre de alguém que amando muito, agora me dá muita raiva também, porque em muita coisa são parecidos, e ele tem sofrido bem por isso, coitado. E nessa conversa em que me dizia que a vida não era fácil e que isto e aquilo, e eu respondi "Enquanto estivermos todos cá, com saúde e perto o suficiente para estarmos quando queremos e precisamos, enquanto nos apoiarmos uns aos outros, está tudo bem, tudo se arranja." E é verdade, o essencial é termos perto quem gostamos e quem precisamos, quando alguém assim nos falta é um pilar que rui parte da nossa vida, que nos ajuda a suportá-la. E é aqui que nos ajudam também a assegurar as necessidades básicas à sobrevivência, e para mim essa sobrevivência passa também pelas pessoas, e por tê-las perto, porque são também a nossa vida. Porque muitas vezes a vida, em si, é já um luxo.
"No ensaio da «Degradação» é que aparece tal expressão, «correntes de sentimento». Para «uma atitude amorosa plenamente normal» (mereceia uma análise semântica atenta, este «plenamente normal», mas adiante), para uma atitude amorosa plenamente normal, diz ele, é preciso que se conjuguem duas correntes de sentimentos: os sentimentos ternos e afectuosos, e os sentimentos sensuais. E em muitos casos, isto purisimplesmente não acontece, infelizmente. «Quando esses homens amam, não sentem desejo; e quando desejam, não conseguem amar».
Pergunta: Deverei considerar-me  incluído nessa multidão fragmentada? Em linguagem clara e simples: os sentimentos sensuais do Alexander Portnoy estão fixados nas suas fantasias incestuosas?O que é que acha Doutor?
(...)
Sim, mas se assim é, como é que se explica aquele fim-de-semana em Vermont? Porque aí romperam-se os diques da barreira do incesto, ou pelo menos assim pareceu. E pluf, os sentimentos sensuais misturaram-se com as mais puras e mais fundas torrentes de ternura que alguma vez conheci! Garanto-lhe que a confluência das duas correntes foi espantosa! E nela também! Ela até me disse o mesmo!
Ou terão sido só as folhas coloridas, doutor, e o lume na lareira da sala de jantar da estalagem de Woodstock, que nos enterneceram a ambos? Terá sido ternura um pelo outro o que sentimos, ou apenas o Outono a fazer o seu trabalho (...) "
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"Começámos o regresso ao fim da tarde, fazendo o trajecto todo de carro até Nova Iorque para prolongar um pouco mais o fim-de-semana. Ao fim de uma hora de viagem, ela sintonizou a WABC e começou a baloiçar-se no assento ao som da música rock. Depois, de repente, disse: «Ah que se lixe o barulho», e desligou o rádio.
Não era bom, disse então, não ter de regressar?
Não era bom viver um dia no campo com uma pessoa de quem se gostasse muito?
Não era bom acordar cheio de energia ao nascer do Sol e ir para a cama derreado quando escurecesse?
Não era bom ter uma data de responsabilidades e passar o dia todo a tratar delas sem lhes sentir o peso?
Não era bom uma pessoa estar dias inteiros, semanas inteiras, meses inteiros sem pensar em si própria? Andar com roupas velhas, sem maquilhagem, e sem precisar de estar constantemente em forma?
O tempo foi passando. Ela assobiou. «Não achas que era incrível?»
«O quê?»
«Ser adulto. Adulto, sabes?"

Philip Roth, in O complexo de Portnoy

23 janeiro 2012

Estou a morrer de sono, quem me manda ficar a escrever e a ler e mais o raio até as três da matina??... sair da cama foi uma penitência para a qual não fiz mal, nem bem, nenhum. Não percebo, dantes não dormia nem metade e levantava-me com mais vontade e melhor cara. Suponho que era uma penintência depois da compensação, era o preço a pagar para ter o lado bom da vida, custa é pagar o mesmo sem ter o mesmo serviço.... deixa de se estar equilibrado e até reequilibrar a vida custa demais... Estou a precisar duma calibração expresso é o que é!!
"Não o amor não tira férias mas também não se queima com distâncias. Se existe ele lá está e estará sempre mesmo que se tente colocar uma tonelada de pedras por cima para o abafar.


30 de Agosto de 2011 18:55 "
Será??
Quantas pedras já teve, e terá, em cima?
Quão, e quantas  vezes, o pobre já foi abafado, sufocado, martirizado?
Será que está lá? Que ainda está? Que alguma vez esteve?
Se não se queima com as distâncias nem com este tipo de tratamento, como raio é que faço para acabar com ele? Não acaba?
Qual é a receita maravilha?
Ahhh já sei perceber que se fosse realmente assim, eu não estaria assim...que o amor, quando é amor, tem a força de suportar toneladas de pedras e de as tirar do caminho, uma a uma, até à última.
E se não for amor acaba. Deve ser isso.

22 janeiro 2012

Deram-me o nome de Eva, curiosa, fui ver o que significa:

"Nome Hebraico "hawwâh" - Significado: Viver.


Significa vida e indica uma pessoa voltada para o lar e para a família, faz questão de inventar e de percorrer seus próprios caminhos. Essa é a sua receita de felicidade. Tem tanto amor para dar, tanta compaixão que é capaz de passar a vida fazendo o bem para os outros, esquecendo muitas vezes que também precisa de receber ajuda e amor.


Eva é por natureza sedutora e possui a força embriagante chamada liberdade. Dinâmica, aventureira, corajosa e audaz, é dificil resistir-lhe . Gosta de arriscar aproveitando ao máximo o que considera as coisas boas da vida.

Frequentemente parece solitária e desinteressada, mas a sua lucidez diz-nos que apenas faz pequenas pausas, sempre na mira dos seus objectivos e dos seu ideais."
Quem me baptizou assim acho que não pensa que sou muito diferente do que aqui está... cheira-me...
Aqui há uns dias fui tomar cfé com uma amiga, anda meia desorientada da vida e não vejo que esteja a melhorar. Casamento com problemas há algum tempo, já havíamos falado e agora pioraram, porque onde o espaço se abre alguém aproveita. Foi o caso, apareceu alguém, alguém que a fez pensar, estremecer, interessar-se. Agora anda baralhada, não sabe que há-de fazer. Disse-lhe o mesmo que havia dito há tempos ainda antes deste extra conjugal, que tinha de ver o que queria da vida, da vida que tinha, se não lhe chega se não a preenche se não a faz feliz, tem de saber se quer tentar remendar o que tem ou começar do zero. Ninguém gosta de começar do zero, é sempre mais fácil quando já se tem uma alternativa de reserva, eu até percebo, acontece que se o que se tem não está bem ou se faz porque fique ou se acaba de vez com a coisa, independentemente de tudo o resto que haja. O que me parece é que quando surge mais alguém é quando a pessoa já não está na relação que tem, já não acredita nela, normalmente já passou pela fase do tentar melhorar e não melhorou, apenas continua a sustentar uma situação porque a alternativa de começar do zero não parece mais atractiva do que continuar como se está, pelo menos não se está sozinho. Entretanto e depois de toda esta conversa passaram-se mais coisas, ela envolveu-se mais, assustou-se, sente-se muito insegura em relação à nova pessoa que lhe surgiu no caminho, que é uma coisa muito fisica, demasiado fisica, e que sexo por sexo tem em casa. E foi esta frase que deu razão a estar a escrever, porque fiquei pasma com a frase. "Sexo por sexo tenho em casa" (o que me pasma é que parece que em casa também é sexo por sexo, andará toda a gente louca?ou eu é que sou louca?) Eu até percebo  a lógica se é só para sexo, isso não lhe falta em casa, se não há mais valia para quê ter outra pessoa? Então perguntei-lhe, "então se não é por sexo porque isso tens em casa alguma coisa deves ter nessa pessoa  que não tens em casa, estás apaixonada? Não, nada disso, longe disso, este homem não é a minha praia. Já teve mulheres a mais, é giro demais e é areia demais para a minha camioneta. " Aqui tive de me rir por dentro. Mesmo, mas continuei, "mas se não é a tua praia, se tens essas inseguranças todas, acabou? Acho que sim. Achas? Se é só sexo e não estás apaixonada, porque é que só achas? Não estarás já apaixonada só não queres admitir porque tens medo? Não, não estou. Isto nunca daria nada e só sexo não quero." Pronto está bem, eu não argumento, porque não vale a pena e não quero incentivar uma coisa que pelo que me pareceu do que ouvi, do outro lado parece-me mesmo só sexo, do dela é que acho que é só negação, mas o tempo dirá.
A questão aqui é que não conheço nenhuma situação em que uma mulher, ou mesmo um homem, não se envolva fora da relação que tem se a relação que tem o realiza, o nutre do que cada um precisa. Nunca se acaba uma relação porque apareceu uma outra pessoa, a relação já tinha acabado antes, pelo menos na sua forma abstracta, ainda que as pessoas possam continuar juntas, algo na relação abriu uma fenda que com o tempo e as quezilias do dia a dia foram abrindo e abrindo, até dar espaço para os olhos começarem a olhar em outras direcções e a ver o que se lá passa. Só que nunca ninguém resolve as coisas por não estar bem, ninguém (ou muito pouca gente, infelizmente) diz basta na altura certa, deixam as coisas arrastar e tentam ignorar o problema que só vai adensando e tornando a solução cada vez mais dificil. Deixam passar, não dizem não a isto nem aquilo que os chateou, empurram com a barriga, o problema subsiste e um dia, só mesmo dando um murro na mesa. Quando o dão, quando não dão entra-se muitas vezes numa guerra surda feita duma paz podre, que dá origem a uma revolta interna a uma raiva silenciosa contra o outro, que mais dia menos dia terá as suas consequências, muitas vezes essa consequência é aparecer alguém. Quando não se resolve a doença, o foco do mal, e vamos tomando placebos de vários tipos, vamos repetindo os mesmos erros, não eliminamos o mal. Por isso tanta gente faz da traição um modo de vida. Cada traição um placebo, o casamento a doença que têm medo de curar.

21 janeiro 2012

Prendada uma porra!!
Retiro o que disse, aquela m.... saiu aos bocados.. Bolo desmembrado...metade no prato, metade na forma....lá vou eu ser gozada forte e feio... Mas para que é que eu falo??? bahhhh

20 janeiro 2012


“Every saint has a past and every sinner has a future.”
Oscar Wilde

[É engraçado encontrar frases que dizem em poucas e curtas palavras exactamente o que pensamos, e neste caso, que até escrevi há poucos dias algo que diz, ou tenta dizer, algo semelhante.]

Uma amiga minha está decidida a emendar-me o desleixo, quer que cuide de mim, até quer que eu desencalhe, antes de me tornar no novo Concórdia, e já agora com menos vítimas...
Supostamente há cremes que ajudam (eu acho que nada chega a uma pessoa sentir-se bem e a tocar fios de felicidade), que nos fazem sentir melhor, e depois há as pinturas de guerra em alturas de paz, paz podre normalmente, mas pronto, que nos fazem parecer mais bonitinhas, arranjadinhas e frescas, e o raio. Eu sempre fui dada a poucas coisas dessas, é meia bola e força e pouco mais. Mas vou tentar, vou ver se resulta um bocadinho, pode ser que me melhore a cara, e de caminho o espírito, e nesse espírito acabei de dizer na brincadeira: "É desta que eu vou ficar linda e maravilhosa!!". A resposta, em tom sério, é que me deixou de boca aberta, antes de largar uma gargalhada..."Olha que isto também não há milagres!!"
Oh meu deus!!! Estou lixada... é que nem mesmo com um milagre lá ia, e ainda por cima ela diz-me que não há milagres!! Bom, deu para me desatar a rir!!! Menos mal.

19 janeiro 2012

Há tempos dei por mim a pensar se será possível pessoas com princípios, com bons princípios, com bom fundo, podem ser pessoas sem bom carácter. E andei a mastigar isto muito tempo, muitas viagens. Hoje, em mais uma, mais uma vez me pus a pensar, porque não tinha ainda conseguido ordenar as ideias, de forma coerente e lógica. Cheguei à conclusão que não, não é possível. O carácter cumpre as fundações dos princípios.
Não basta ser boa pessoa da boca para fora, ser sério na teoria, ser honesto no abstracto, há que perante a situação que a vida nos impõe cumprir com esses princípios, ou será só fachada para enganar turista. Toda a gente é honesta e incorruptível, pelo menos da boca para fora, até ao dia em que afundado em dívidas lhe oferecem um suborno para fazer algo ilícito, que pode até não ser grandemente prejudicial a ninguém, mas que ainda assim é errado, ou que até aquele momento, sempre o tinha sido, pelo menos da boca para fora. Na verdade todos temos muito bom carácter até ele ser posto à  prova, só aí sabemos do que somos feitos, até lá é só ideais de compromisso, nada mais pálpavel que isso.
Penso que alguém com carácter é alguém cujos princípios e vida correm, quase sempre, adjacentes, são consistentes.
Se os principios forem bons - bom carácter, se os principios forem menos recomendáveis, será o que se chama de mau carácter. Porque também os há, e não são poucos.
Mas, e apesar de tudo, um bom carácter também erra, o que o distingue dum mau caracter é que se erra, não o faz com má intenção, não o faz para levar a melhor, e no caminho, se preciso for, pisar ou lubibriar quem se interpuser no seu caminho. E principalmente, se o fundo for bom,  pesa-lhe a consciência do erro, algo o levou a fazer uma coisa que considera errada, e isso pesa-lhe todos os dias, não o faz despreocupadamente, há culpa e arrependimento. Fez porque errou, porque alguma circunstância o atenua, porque terá uma justificação, boa ou má, mas que seria a sua justificação, e nunca com maus fundamentos. Tal como um mau caracter, que sempre o demonstrou toda a vida, repetida e inequivocamente, não deixará de o ser por ter feito algumas coisas bem, também um bom carácter não pode ver uma vida inquinada porque algumas vezes agiu mal. As pessoas merecem quanto mais oportunidades quanto mais fizeram por elas. Não percebo aquelas pessoas que são consideradas quase santas, uns modelos de vida, e um dia porque fizeram uma qualquer coisa que ninguém as julgava capazes, caem do altar e vão directo para a valeta... e no fim ainda se ouve dizer (quase contentes, ou mesmo contentes) "nunca me enganou.." Não concordo com isso, quanto melhor alguém se esforçou por ser até fazer asneira, mais oportunidades deve merecer (até eventualmente deixar de merecer, porque também acontece...)
No fundo, o importante é o fundo que forra as pessoas, a forma como tratam e pensam nos outros, se com respeito, consideração e igualdade, ou apenas como ferramentas, degraus, caminhos, para se obter algo. Erros toda a gente comete. Erros conscientes e consistentes, não eliminados ou reparados, já podem desmoronar todo um carácter, em vez de apenas deixarem brechas que nos lembram por onde não ir. Porque também há as pessoas sem carácter (a quem muitas vezes se chama de mau carácter, embora a mim não me pareça que seja a mesma coisa), e estes são os que ainda não decidiram que princípios têm ou querem seguir, tanto fazem bem como mal, tanto se fazem reger por bons princípios como são exímios em contorná-los em proveito próprio, ainda que a custo de uma ou outra pessoa, ou manipulando esta e aquela, e aí por diante. Não são consistentes em si mesmo, não têm personalidade formada, boa ou má.
Como dizia Gandhi a felicidade está em poder fazer-se e dizer-se segundo pensamos (mais ou menos isto, não decoro frases...), e acho que o que ele queria dizer é que a tranquilidade e paz de espírito que se vive, por podermos ser consistentes e fieis a nós próprios, por não nos sucumbirmos perante a vida, será algo próximo da felicidade (eu não lhe chamaria felicidade, mas...).
Já fiz coisas de que me arrependi, que acho que foram erradas. Poucas, mas algumas. Acho que isso abriu brechas nas minhas fundações, questionei-me dos meus princípios, avaliei o meu erro e o que podia fazer para repará-lo ou eliminá-lo, e fiz. Abalou-me o carácter, sim, modificou-me em muitas coisas, fez-me pensar muito, e obrigou-me a tomar posições em que me possibilitasse aproximar-me da felicidade que Gandhi falava, e que me devolvesse a minha consistência, que não me traísse. O que esteve nas minhas mãos, o que eu consegui fazer, fiz. O que não consegui, por ter mais força que eu, não fiz, porque era apenas outra forma de me trair, e felicidade seria a última coisa que me poderia trazer, quanto mais paz.

15 janeiro 2012

Nem na cama estava bem, levantei-me por fim, farta de sentir o vazio de olhar para o lado vazio. O tempo está-me com a alma. Apetecia dormir em frente à lareira, abraçada a quem nos espanta a solidão, a olhar o fogo, em silêncio entrecortado de conversas parvas, ou não e muitos risos e sorrisos distribuidos por bocas e olhos. Mas nada disso é o que temos, por isso, vamos sair porta fora para fugir do vazio que hoje se sente por aqui. Ver gente, tentar não pensar, e principalmente sentir. E porque a dispensa não se enche sozinha...

14 janeiro 2012

Jantar num tabuleiro em frente a lareira. Sozinha. A pensar que este sozinha foi escolha, convites para jantar não faltaram, mas nenhum deles me ia fazer sentir menos só. Por isso, apesar de jantar sozinha por opção, a solidão nunca é solidão por opção. O ter companhia, ou não, é que é.
Não se consegue prender o mar
nas mãos em concha
Nem o coração
de ninguém preso
Encontramos um oceano inteiro
Ao tropeçarmos num búzio
Que chamam vazio
Morto
Vivo na força do mar
Que se ouve eterno
Que mãos algumas conseguem conter
É preciso abrir as mãos
Para o coração bater livre
No peito certo
Para encostar a minha cabeça
Ao teu

11 janeiro 2012

" A criança é pequena e encerra o homem; o cérebro é estreito e abriga o pensamento; o olho é um ponto e abrange léguas."

Alexandre Dumas, A Dama das Camélias

As aparências enganam. Raramente o que parece ser é, e nem sempre o que pensamos que vemos é o que vemos quando pensamos...
"Quando a vida contraiu um hábito como o deste amor, parece impossível que esse hábito se rompa sem quebrar ao mesmo tempo todas as outras molas da existência."

Alexandre Dumas, A Dama das Camélias

10 janeiro 2012

 
Há imbecilidades que eu tenho pena que não mas digam a mim. Tenho tido poucos momentos de diversão ultimamente, e isso sempre animaria. Ouvi no outro dia que alguém teria dito que as pessoas que se separam nunca mais conseguem ser felizes. E eu tenho pena, tenho mesmo pena que estas coisas, não só não me sejam ditas a mim, como não sejam ditas em público, talvez porque saibam o quanto são imbecis e não estarão convencidos do que dizem, ou então, pior, estão disso convencidos, mas não o assumem com medo de que em reunião social haja algum infeliz separado, que certamente não se calaria à imbecilidade em questão. Para além do perigo de haver pessoas que podendo já ter sido divorciadas, ou separadas,  já estariam em novas relações e agora felizes, e era chato ter logo ali à mão uma prova empírica que apontava o dedo bem recto à crua imbecilidade proferida. Seria humilhante, mas devia-o ser mais dizer certas coisas e ficar impune. De facto não sei qual das duas hipóteses a melhor, porque as duas me parecem bastante más. Se se diz sem se estar convencido disso, não faço ideia porque será que o dizem, a não ser que estejam a fazer de quem os ouve imbecil (tentando-os convencer duma imbecilidade), e por isso seguro de não replicar. Se se diz convicto da barbaridade em si, mas não se repete em sítios susceptíveis de discussão, parece-me um pouco cobarde, ou hipócrita, no mínimo. 
Parece-me estranho que alguém não se separe com a razão de que depois de separado não mais será feliz. Não me parece o ponto de partida, o inicio lógico seria perguntar se a pessoa casada está feliz. Se está, a questão não se coloca, pelo menos não a ela, poder-se-á colocar se a pessoa com quem está casada não estiver feliz. E se uma não estiver feliz, será possível fazer a outra feliz?? Melhor, será possível alguém ser feliz sabendo que a pessoa com quem está não está, ou é, feliz com ela? Que a razão de se manterem casados é porque as pessoas que se separam nunca mais são felizes? E casadas são? Uma das partes obrigando o casamento a aparentar manter-se é felicidade? Para quem? A infelicidade é reconhecer isso mesmo e tentar ser feliz???? Ver que não se está bem, e que é impossivel alguém o estar junto de alguém contrariado? Dar a oportunidade de os dois serem mais felizes, um por vontade própria e o outro porque não se consegue ser feliz ao lado de alguém que só o está por obrigação, contrariado, para cumprir contrato? 
Bom, só consigo encontrar maneira de responder que sim se virem a felicidade de se estar com alguém duma maneira muito diferente da minha, ou seja, estando com alguém mas sozinho, e assim ser feliz com isso. E isso é um casamento? É. De há uns séculos atrás, mas é. Quando o casamento era um contrato onde cada parte tinha um ganho, uns casavam com o estatuto e posição social, outros com o dinheiro novo, ou então juntavam grandes e boas famílias para aumentarem fortuna, poder, ou laços estratégicos de negócio. Sim, assim faz sentido. O casamento tem uma razão racional e bem sustentada, e cada um vivia, mais ou menos, a sua vida. O homem era feliz se tivesse dinheiro, estatuto e mantivesse a amante que gostasse. A mulher, a mulher não faço ideia, era feliz porque tinha uma certa posição social, e os filhos, e lia, e bordava, ou coisa que o valha. As mais audazes e espertas lá conseguiam maneira de também arranjarem muito discretamente (muito mais do que os homens, que abertamente lhes era admitido) um amante que lhes alegrasse as horas entre os bordados, as leituras e o canto. E pronto, era assim. Ninguém se separava, claro, porque o fundamento do casamento não era a felicidade, quanto mais o amor. Depois puseram-se a inventar e acharam que a inovação do amor como fundamento do casamento era mais engraçado, deram liberdade às pessoas para se escolherem entre si. Estragaram tudo, estava tudo tão direitinho, certinho e racional e deram cabo da instituição. O paradigma mudou, ou melhor, para alguns mudou, para outros pelos vistos não (devem ser pessoas retrógradas e machistas, só pode). Realmente, e no que toca ao casamento, o amor, ou a pretensão à felicidade, estragou tudo, porque se tornou muito mais difícil escolher, acertar nessa escolha, e ainda por cima logo à primeira (uiii...porque se nos separarmos temos o carimbo da infelicidade nas trombinhas...)!! Até aí concordo plenamente, agora que se assuma que as pessoas casam por amor, e para serem felizes, e não o sendo, não se separam, porque senão serão infelizes é que eu não percebo... E a quantidade de pessoas que se divorcia e que encontra alguém com quem realmente se dá bem (acertam à segunda, vá... bolas...cambada de pessoal com má pontaria na escolha!!)? De quem realmente gostam? Problemas, chatices?? Terão, claro, mas não terão mais ainda presos a um casamento onde não são felizes e onde já não sentem razão para estar? Onde tudo é um problema e uma chatice só, sem príncipio nem fim? 
Não percebo, devo ser estúpida que nem um pneu. 
E expliquem-me por favor como é que alguém consegue ser feliz se achar que a sua felicidade está em prender alguém? Em saber que só não se está sozinho por ter o poder de prender alguém? ou tentar, sequer? Em obrigar alguém a estar ao seu lado? E estar bem assim? Isto chama-se o quê? Manipulação? Ditadura? Egoísmo extremo? Estupidez?
Alguém me quer explicar? 

06 janeiro 2012

" Ele admira igualmente os «esposos divorciados» que têm a coragem de assumir aquilo que são, «de se revoltarem abertamente» contra a vida matrimonial, assente mais nas conveniências e nas tolices moralistas do que no amor mútuo. Em contrapartida, não poupa nas palavras contra os preguiçosos do casal, esses traidores do amor, que se alapam com moleza ao lar, «aqueles que se revoltam apenas em pensamento, sem ousar passar à acção, esses miseráveis esposos que suspiram pelo amor há muito tempo desaparecido(...), que se encerram como dementes na sua célula conjugal, agarrando-se às grades e debitando frivolidades a respeito da amarga tristeza da sua união». "
(sobre Kierkegaard)

" A paixão, o sexo, o espanto dos primeiros dias, tudo isso é transitório. Restam as palavras que se trocam, as conversas que enriquecem. De tal modo que a única questão a colocar verdadeiramente antes de casar com alguém será, no fundo, a seguinte: «Acreditas poder conversar com esta mulher até à tua velhice?» Para lhe responder, será ainda necessário aprender a «amar para além de si mesmo», ou seja, com o desejo de melhorar. "
(sobre a visão de casamento de Nietzsche)

" «Em vez de, como antes de sermos amados, nos inquietarmos com esta protuberância injustificada, injustificável que era a nossa existência; em vez de nos sentirmos "a mais", sentimos agora que esta existência foi retomada e desejada nos seus mais ínfimos detalhes por uma liberdade absoluta que ela ao mesmo tempo condiciona. Está aí o fundamento da alegria do amor desde que ela existe: sentirmos a nossa existência justificada.» Amado, já não sou um elemento que se destaca com o mundo como pano de fundo, sou aquele através de quem o outro vê o mundo. Amado, eu próprio me torno mundo."
(o doidivanas do Sartre e a sua visão do amor como me parece que nunca o viveu verdadeiramente)

tudo in Os filósofos e o amor, Aude Lancelin e Marie Lemonnier

Neste livro em que o amor se reduz a transitório, basicamente fortemente justificado apenas naturalmente e instintivamente, com pouco de elevação de sentimento, ou união de almas, para além da ilusão necessária para surtir o seu efeito natural e passageiro com fim à procriação e manutenção da espécie. Tantos ilustres a pensarem sobre o amor, todos a viverem-no mal, ou a nem sequer o viver.
É um bom instrumento de reflexão, ou foi-o para mim, para saber o quão devo estar enganada e quanto quero continuar enganada. Às vezes é bom não ser um grande ser pensante, e ter-se ideias mais comezinhas sobre coisas que se consideram grandiosas como o Amor.

05 janeiro 2012

A boca deste homem agora persegue-me em cada curva da cidade
 (felizmente não com esta camisa, ou começava a ter pesadelos...)
Em cada curva me espalho em memórias, me escancaro em sorrisos que não se vêem, em lágrimas que estão por cair, e em tantas que já secaram e se esqueceram que foram.