Como quase desconhecidos de todos os restantes, olharam-se no silêncio conhecedor do outro. Ela encurta a distância entre eles, inclinando-se para ele como quem vai sussurrar. Ele sente-lhe a respiração quente no pescoço e uma mordiscadela na orelha. Ela olha-o, mergulhando no olhar quase surpreso dele, habituado aquelas brincadeiras mas sempre surpreso com elas, e diz "estava aqui mesmo 'al dente' ". Ri-se com ar de menina endiabrada, cabreirinha. Ele, a aproveitar o canto afastado onde estavam e ela estar de costas para a parede, começa a rir-se por dentro em antecipação; inclina-se para lhe sussurar a resposta silenciosa, que ela sente, com uma mão naquele sítio onde as costas mudam de nome a agarrá-la com vontade firme, enquanto ouve em tom quente, quase ronronado, "estava aqui mesmo à mão". Riem-se no olhar atrevido que trocam, denso de urgência. Entendem-se nos olhares como nas pontas dos dedos, dos dentes, da pele. Entendimento só possível quando tudo o resto está entendido.
Estão fartos de desconhecidos cansados de conhecer. Não se fartam de se reconhecerem, e a urgência rosna selvagem no olhar quase quieto. Quase.
[...bem sei que não são horas destas coisas, mas aparecem-me sem aviso de relógio, ou geografia de bons modos, a qualquer hora. Perseguem-me os momentos e fervilham-me também nos dedos, deixo-os aqui à falta de mais onde os despejar com vontade.]
Bom Dia