Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

13 agosto 2014


Eu vou tirar do dicionário
A palavra você
Vou trocá-la em miúdos
Mudar meu vocabulário
e no seu lugar
vou colocar outro absurdo

Eu vou tirar suas impressões digitais
da minha pele
Tirar seu cheiro
dos meus lençóis
O seu rosto do meu gosto
Eu vou tirar você de letra
nem que tenha que inventar
outra gramática

Eu vou tirar você de mim
Assim que descobrir
com quantos “nãos” se faz um sim
Eu vou tirar o sentimento
do meu pensamento
sua imagem e semelhança
Vou parar o movimento
a qualquer momento
Procurar outra lembrança
Eu vou tirar, vou limar de vez sua voz
dos meus ouvidos

Eu vou tirar você e eu de nós
o dito pelo não tido
Eu vou tirar você de letra
nem que tenha que inventar
outra gramática
Eu vou tirar você de mim
Assim que descobrir
com quantos “nãos” se faz um sim

Alice Ruiz

[ahhh eu vou!!...]
...sempre uma boa maneira de começar o dia!!!
ehehehhe

Bom Dia!!


“Dançava como um títere, tendo os cordéis dentro dela, atados na alma. Depois tomou-me nos seus braços e, sem pedir, desapegou-me das roupas. De todas as roupas. Colocou-me a outra coroa e convidou-me para dançar com ela, os dois nus. O meu corpo não tinha cordéis na alma, apenas acanhamento; sentia-se vazio de música. Mas ela pegava-me nos braços, endemoninhava-me o corpo, arrastava-me no seu bailado revolto. E ria. Um sorriso que se media a palmos como se mede o diâmetro do mundo, redondo, grávido, imenso. E eu entrei dentro desse sorriso, onde coube nu e sem vergonha. E dancei com ela como dança um louco, como se não houvesse amanhã, como se o hoje fosse pouco. E quando os nossos corpos caíram na cama, despidos e cansados, dormimos como dormem as flores, caídas umas sobre as outras, a partilhar o calor, a dividir o luar. Só quando tudo dormia já, senti que havia música dentro de mim. Finalmente. Música…”

João Morgado

[...lembro-me de dizeres que eu beijava como quem gosta, lembro-me de dizeres que gostavas quando tinha pressa na vontade, quando a força do desejo se notava nos gestos, lembro-me de dizeres que gostavas de tudo em mim e de ficares a olhar para mim a dizer que eu era linda, lembro-me de dizeres que até da minha gargalhada gostavas e de ficares muitas vezes a olhar para a minha boca enquanto falava, lembro-me de a meio duma conversa qualquer me calares com um "adoro-te" ou com aquele "olá" da praxe que faz recomeçar tudo e começar pelo beijo que faltava, lembro-me  de quando me querias desconcertar perguntares-me se hoje já alguém me tinha dito que sou linda, lembro-me de me chamares fera e bruxinha e cobra porque te enrolava nas minhas pernas, mesmo a dormir, lembro-me de dizeres que sabia dançar, que usava cada músculo como queria, lembro-me das conversas à lareira, ou com a porta da varanda aberta a ver o céu que restava para nós, lembro-me de dançar contigo à luz de copos de vinho, sentados no chão enquanto o teu braço nos fazia um só corpo e o balançar era o nosso silêncio a dizer o que as palavras não sabem.
Lembro-me ainda de tanta coisa, tanta coisa onde coubemos sem vergonha e inteiros (ou só eu), como se não houvesse amanhã, porque só havia o agora, e o agora era o nosso mundo, e a música era o silêncio dos olhares que conversavam, e em que as almas que se entendiam.
Quando é que o mundo acabou se ainda há música dentro de mim, mas o agora já era?
...não me lembro... ]

Boa Noite