Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

25 junho 2015

... e agora apetece um café.
Naquela esplanada, apelidada de chuta cus, ao sol, a caminho de casa.
Bebida atrás dos óculos de sol, o amargo do café 
com o doce do que já não se sonha mas ainda não se esqueceu. 
O sol sempre aquece, que a alma já não esquenta a pele.


"Não sei se é isto o amor, fazer contigo planos e projectos e todos incluírem foder-te. Há quem construa casas para morar, ou para exibir, ou só para as ter, eu tudo o que construo inclui a minha língua na tua, a tua mão na minha, eu dentro de ti como tu estás dentro de mim.
As histórias de amor parecem ser outra coisa; nunca ninguém falou da tesão de Romeu por Julieta, portanto, a julgar pelos livros, não deve ser isto o amor.
É que nos livros, quando o herói vê por vez primeira a que há de ser a sua amada, não diz “fodia esta gaija toda”. O amor à primeira vista costuma ter mais doce e menos sal e infinitamente menos esperma, nunca costuma ser dito com essas letras todas, com as letras que dizem “quero foder-te toda desde o primeiro minuto em que te vi, e continuar a foder-te até que o sol expluda e que o universo acabe”.
Mas é isto que temos, e eu gosto. Provavelmente não é amor, que isso do foder, dizem, é paixão, fogo de palha que o tempo apaga – o verdadeiro amor é o do depois, o que fica quando a tesão se esgota; se é assim, nunca te amei, nunca passou um dia em que não quisesse foder contigo."

Do Menino, sobre o amor, ou sobre o amor dele, como ele entende, e eu parece-me que o entendo.

Leio e oiço nas minhas memórias alguém dizer-me que mal me via só me queria encostar à parede, encostar os corpos na pressão da vontade, comer-me a pele por dentro, colher-me nos seus próprios lábios, invadir-me, ter-me, termo-nos. Via-me, e dizia que era isto que lhe passava pela cabeça, pela memória da pele, da ponta dos dedos, da língua, de tudo. Não sabia se era a maneira como me mexia, como olhava, não sabia, porque dizia que bastava ver-me, que havia uma ligação que se fazia, uma ponte que se atravessava, um atalho que se percorria para nos acharmos sozinhos, juntos, um no outro, na urgência da tesão, nos domínios do desejo, reféns da vontade recíproca. 
Sim, se calhar nunca foi amor. Também eu, poucos dias houve, em que vendo-te, não me apetecesse apetecer-te, agarrar-te esse apetecer para que não me fugisses, porque apeteces-me sempre nesse teu atrevimento doce, nessas brincadeiras malandras, nessa tesão que acarinho em nós e me consome quando vejo as tuas mãos. 
Amor não deve ser isto, deve ser outra coisa, ainda posso ter esperança. 
O amor ainda está para a frente, não o deixei já, perdido, na vida que já não é.


Receber uma mensagem que nos acorda é bom, não a parte de nos acordar, mas a parte de acordar com alguém a lembrar-se de nós. Mas não, não concordo contigo, deitar cedo e cedo erguer não dá saúde e faz crescer... Dá sono! Muito. Porque deitar cedo não é adormecer cedo, e levantar cedo é sempre acordar quando se dorme melhor.... E fico cá a pensar que quem mandou a mensagem não deve ser uma "ronha person" e isso não é bom, não... Mensagens para acordar é.  Está a modos que meio empatado, portanto.

Bom Dia
... Boa Noite.

[frase, das (muito) boas de "A Trégua"]

"Porque desta vez falei-lhe com toda a franqueza; o tema casamento foi discutido até à exaustão. «Antes de virmos para aqui, para o apartamento, eu apercebi-me de que, para ti, era penoso pronunciar essa palavra. Um dia, disseste-a, à entrada de minha casa, e tens toda a minha gratidão pelo facto de a teres dito. Serviu para que eu me decidisse a acreditar em ti, no teu carinho. Mas não podia aceitá-la, porque teria sido uma base falsa para este presente, que nessa altura era futuro. Ao aceitá-la também teria tido de aceitar que tu te submetesses, que te obrigasses a uma decisão para a qual ainda não estavas preparado. Em contrapartida, submeti-me eu, mas como é lógico, posso estar mais segura das minhas reacções do que das tuas. Eu sabia que, mesmo submetendo-me, não te guardaria rancor. (...) Por isso te digo que agora não tenho a certeza de que o casamento seja a nossa melhor solução. O que é importante é que exista algo que nos una; esse algo existe, não é verdade? Ora bem, não te parece mais poderoso, mais forte, mais bonito que aquilo que nos une seja isso que existe verdadeiramente e não uma simples formalidade (...) E, finalmente há o teu medo do tempo, de envelheceres e eu olhar noutra direcção. Não sejas tão melindroso. Aquilo de que eu mais gosto em ti é algo que o tempo não será capaz de te tirar.»"

Mario Benedetti, in A Trégua


"(...) ao aceitá-la também teria tido de aceitar que tu te submetesses, que te obrigasses a uma decisão para a qual ainda não estavas preparado. Em contrapartida, submeti-me eu, (...)" - esta frase foi talvez das que mais me marcou neste livro. Li, sorri, fechei o livro, percebi a sensibilidade do homem que o escreveu e o entendeu: o gesto de amor, dos mais belos e mais imperceptíveis. Acho que este pequeno grande pormenor passa ao lado de tanta, tanta gente; e este pequeno grande pormenor é amar, amar verdadeiramente. É incrível como isso passa tão despercebido, como não entendem, como quem vê de fora não percebe, que às vezes nos submetemos ao inimaginável para não submetermos, não obrigarmos, quem amamos ao que imaginamos não estarem preparados para fazer, para que, no fundo, afinal, não se submetam. Simplesmente não se submetam. E ao fazê-lo ser opção consciente, sem mágoa, sem exigência alguma, apenas por não querer provocar, ou de alguma forma forçar, uma reacção no outro que queremos que seja livre e espontânea: verdadeira. Só assim o admitimos - verdadeira -, seja qual for o tempo que precise para que nasçam em si certezas, porque só queremos alguém com a certeza genuína, que nasce por dentro, selvagem e livre, cheia de força. Só assim terá força, a força da vida que pulsa no sangue que o coração faz correr - que faz viver realmente. Provocar uma resposta não é responderem-nos, é reproduzirem o que queremos ouvir, não nos responde a nada, é uma espécie de monólogo estéril, que só contenta a quem gosta de se ouvir: quem não ama, não sabe amar. Porque quem ama só quer amar e ser amado - sentindo que ama e que é amado -, e isso nunca pode implicar submissão, a não ser ao próprio amor ("em contrapartida, submeti-me eu"...). Não se força, não se provoca, não se faz, surge, e quando surge tem a força que dá a certeza de ninguém ser obrigado a submeter-se - a não ser ao amor que os dois sentem, ou não vale de nada, não vale nada. E isto, isto que se sente assim, é uma coisa que o tempo não pode tirar, o que pode tirar - e tira certamente - é a certeza de que o outro nos deixa sempre submeter, sem nunca chegar o tempo, dentro do nosso tempo, de querer realmente ficar junto, e que "importante é que exista algo que nos una". E isso seja vivido.