Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

04 junho 2014

"Falo como homem e como poeta, falo das emoções que nos fazem crescer e nos dão a esperança para transformarmos as dúvidas em certezas, as fragilidades em forças, as incertezas na mais criativa e fascinante descoberta de nós próprios. Falo do amor como se só existisse essa luz que iluminasse todos os outros caminhos. No fundo, é essa luz que todos procuram, que todos perseguem, que todos sonham e que faz com que haja “coragem” para separar o essencial da vida de uma “loja de conveniências”. A maior parte das relações são “lojas de conveniências”, onde permanecem as razões de cada um: as objectivas e as subjectivas. Não quero resvalar para a explicação científica da Lua, quero fixar-me no olhar poético do homem que continua a ver o amor e a Lua como territórios de romantismo e de encontro, como “estados nascentes”, que fazem andar o mundo, ou seja, a vida de cada um, as vidas dos que têm o privilégio de se reencontrarem com o despojamento necessário para uma entrega sem condições. O preço de ficar refém de uma relação onde “já gastámos as palavras” e o amor é incalculável, comparado com a felicidade de partilhar esse amor com alguém que nos renova e nos faz renascer, que nos devolve a esperança e o sonho. Não tenho dúvidas em comparar o “preço”, quando se fica refém de alguém por razões de funcionalidade. A morte precoce da paixão e do amor são certidões de óbito que certificam uma vida insuportável, um faz de conta diário, as obrigações conjugais sem emoção, a tristeza, o desencanto, a amargura e um mundo a preto e branco. O “preço” de ficar nas relações gastas é para a vida, o “preço” de mudar em nome do amor dura apenas algum tempo, é apenas o tempo de ajustar a nova luz a um horizonte onde tudo parece escrito pelo “criador” para nos receber com o arco-íris. Não há maior dor do que viver numa tristeza sem horizonte de alegria, do que viver rendido a essa fatalidade onde todos se regozijam com as aparências, mas ninguém se preocupa com os sentimentos de cada um. Vivemos um tempo de hipocrisia onde se premeiam os condomínios fiscais, onde se critica os que têm coragem de mudar de vida, apontando o caminho aos que ficam na sua “loja de conveniências”. Coragem têm os que são capazes de dizer NÃO, mesmo que a maioria diga o contrário só para se iludirem colectivamente; coragem têm os que são capazes de dizer NÃO, em nome do amor e da cumplicidade da pele e do sémen. 
Perder o olhar romântico, que alimenta a eternidade quando encontramos no outro a parte que nos falta, é recusar a dignidade que a adolescência nos ensinou. Quem se recusa a ser feliz, empresta-se à morte antes de morrer."

António Vilhena

4 comentários:

Mary Poppins disse...

O amor como luz que nos guia muitas vezes é uma utopia. Pomo-nos ao caminho por causa dele e se a luz se apagar temos de continuar às apalpadelas, porque já fomos longe demais. O engraçado é que até essa luz apagar-se, muitas vezes nem temos noção que estávamos precisamente a fazer aquele caminho somente por causa disso. Eu estou a dias de distãncia de mudar-me para um sítio que eu pensava querer muito. Mas entretanto percebi que o meu querer estava directamente relacionado com outra pessoa. Uma pessoa da qual desisti, após muita, muita cabeçada e pancada. E não há um dia em que eu não pense que se calhar, só se calhar, guiar-nos pela luz do amor é uma grande treta. Porque depois mete-nos nestas situações.

Eva disse...

Se calhar são precisas as cabeçadas para ver se a luz é verdadeira ou não. Mas o que é certo é que a única - ou da únicas - coisa(s) que nos põem ao caminho com vontade é essa luz, porque é aquela que pensamos que nos pode levar à felicidade que queremos para nós, então vamos caminhando. Se a luz se apaga perdemo-nos um pouco, andamos às apalpadelas, tudo perde sentido, mas temos de continuar... A luz do Amor pode até ser uma treta, mas ainda acho que é a única treta que vale a pena, porque um dia pode não ser (treta)!!...
:)

Mary Poppins disse...

e com esse pensamento é que tantas e tantas vezes fui voltando atrás, desculpando, afinal quantas vezes pode aquela pessoa errar tanto? Era esperança. Esperança que não fosse realmente treta... Mas sim, a luz do amor existe. Pena que nem sempre ao mesmo tempo para ambas as pessoas.

Eva disse...

...pois, percebo-te.
Realmente um amor correspondente é um curto-circuito (frase que nunca mais esqueci do Samuel Beckett), é muito raro, é um acaso que faz saltar vários obstáculos, mal entendidos, desencontros, afectos trocados... sei lá. É raro. E realmente, o resto é sempre mais ou menos treta. Não é uma luz própria, é uma iluminação alimentada por conveniência, conforto, ego ou sei lá quantas razões que não consigo, nem quero, imaginar.