Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

13 agosto 2012

"«Não precisa dessas roupas para nada, avó», disse a Natália, e saiu zangada comigo. Como explicar-lhe que só preciso do que não serve para nada? Ela nunca compreenderia. Casou-se com um rapaz que lhe serve para tudo. Dividem a prestação da casa comum e dos automóveis individuais, ele cozinha e ela arruma a loiça na máquina de lavar, apoiam-se mutuamente em épocas de crise, gostam dos mesmo filmes, livros e discos, e sobretudo, garante ela, «cada um respeita o espaço do outro».
   Se não fosse a Natália, e se não fosse uma heresia, teria dito «Ámen» quando ela veio, eufórica, debitar-me esta lista de vantagens e convidar-me para o casamento. mas só me ocorreu perguntar-lhe se estava apaixonada por ele. Riu-se de mim. Fez-me uma festa na cara, mas riu-se de mim, e explicou-me que hoje as mulheres já não são tão tontas que se casem por paixão. Disse-me que está estatisticamente provado que os casamentos por paixão acabam ao fim de poucos anos. 
(...) Queria lembrar-lhe as noites que passei a limpar-lhe as lágrimas e a ouvi-la falar do Álvaro, por causa da condescendência com que ela me passara os dedos pelo rosto. Queria lembrar-lhe as vezes em que me confessara: «Preciso de sentimentos à antiga, Jenny, com maiúsculas, leis e provas de passagem!» Tinha saudades dessas noites em que ela me falava do amor dos homens numa linguagem que eu podia entender, sem entrosamentos nem estatísticas."

"Mudava o riso em lágrimas em menos de um segundo. Passei anos a temer que esse excesso de nascença lhe rasgasse a vida em pedaços. "

"Não tinha medo de se perder; sabia que é esse o preço da inquietação."

Inês Pedrosa, in Nas tuas mãos

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