Eva me chamaste

Fizeste das minhas costas o teu piano

Dos teus desenhos as minhas curvas

Da minha boca a tua maçã

Dos meus olhos o teu mar

Do meu mundo os teus braços


(...)

09 julho 2014


"nunca gostei do anel que marido e mulher usam. porque tem pouco de pessoal, tem pouco de história, de amor. porque tem muito mais de posse, de padrão, de obrigação: porque todos usam no mesmo dedo, no mesmo formato, e para todos, significa o mesmo. e eu não gosto de coisas padrão. por isso prefiro, muito mais, todos os anéis, fios, pulseiras que tem uma história própria, um significado seu. que são usados não porque sim, mas porque apetece naquele dia, naquela hora. não porque estão sempre lá - mas porque estão sempre a ser lembrados de se porem lá. bonito quando alguém usa um fio porque acordou a pensar no que ele significa. bonito quando alguém usa uma pulseira apenas porque lhe apetece beijá-la no pulso durante o dia. porque ai sabemos que estamos ali, não por hábito, mas por uma vontade idiota, quase infantil -mas pura-, de estar junto.(...)"

É por isso que eu gosto de objectos com alma, com a alma que lhes damos quando lhes atribuímos um significado, uma memória, um cheiro do que se sentiu e se repete cada vez que esse objecto nos toca, o pomos ou o tiramos, ou passa pelo nosso olhar. Até pode ser só uma música, um cd, qualquer coisa, até pode ser um nome que se põe a um filho, que não tem nome de moda mas tem um nome que tem história própria, de raízes e de sangue, e duma alma que se quer dar. Gosto das coisas com significado próprio, um significado que só existe num mundo restrito e nosso, como um código mudo feito de memórias e gostares e de querer recordar o quanto se gosta em coisas pequenas; em quanto se revive e se ama e se sorri por uma música que traz atrás uma conversa, uma imagem, um sentir. E sempre um sorriso revivido no presente, mesmo que tantas vezes entre lágrimas salgadas. Uns óculos oferecidos porque andam sempre pendurados perto de quem queríamos sempre perto, para nos lembrarem, ainda que saibamos que só nós nos lembramos. Só nós nos lembramos porque os demos, o gosto que a ideia nos deu, o porquê da ideia e o que pensávamos que poderia provocar de sorrisos, que se queriam partilhados ainda que na distância. A alma está no entender das pequenas coisas, coisas nossas, vedadas aos olhos de quem só vê a superficie, como um segredo bem guardado por dentro do calor do outro que se sente no mais frio dos dias, está no saber que objectos nos andam sempre pendurados para lembrar sentimentos que não se despenduram nem nos largam, que queremos que não larguem.
No fundo porque queremos ser lembrados, para nos lembrarmos - logo depois , e entendermos - que quem quer ser lembrado é porque não o é.
Eu não quero voltar a usar aliança, aliás cada vez mais estranho vê-las, desenvolvi uma relação muito estranha a vê-las a assimilá-las. São exibidas com gáudio mas raramente são sentidas, muito menos sentidas com ganas, com ganas de sentir alguma coisa, mesmo que nunca se tirem. Coisas sem alma nenhuma e cheias de fantasmas que nos desabitam, tantas vezes.

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